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Expresso: Nos atentados terroristas há a sensação de que as vítimas foram “instrumentalizadas” e isso torna o luto mais “prolongado”

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A dificuldade em dormir, as memórias, o frequente recordar e reviver do momento, a irritação e o susto, a ansiedade e o pânico. Sintomas normais que resultam de uma experiência e de um momento nada normais. Depois de um atentado terrorista, como ficam os que ficaram? E como se faz o luto de quem nele morreu?

"Chamam-lhe uma tempestade perfeita, um momento em que a imprevisibilidade se alia à intencionalidade de fazer mal, à instrumentalização das pessoas e ao desvalorizar da vida humana, com a dimensão e o mediatismo com os quais ninguém está habituado a lidar. “Um atentado terrorista tem tudo para ser um evento altamente traumático”, diz ao Expresso Bruno Brito, psicólogo e responsável pela rede de apoio a familiares e amigos de vítimas de homicídio e terrorismo da Associação de Apoio à Vítima (APAV).

A explicação chega depois: “Há sempre uma mensagem subjacente no terrorismo, ideológica ou extremista. Há uma intenção de instrumentalizar as pessoas, o atentado é cometido com um determinado objetivo e as pessoas têm muita dificuldade em processar aquilo que é uma desconsideração brutal do valor da vida humana”. Por isso, o luto acaba por durar mais tempo do que numa situação de morte natural ou por doença prolongada. “Por norma, são seis meses mas nestes casos estende-se por mais tempo, acabando muitas vezes por estar agarrado à conclusão do processo judicial — e no terrorismo já se sabe que este não vai ser resolvido com celeridade. Os sobreviventes e familiares de vítimas vão continuar a ser lembrados do que aconteceu”, sublinha o psicólogo.

No Sri Lanka, as centenas de pessoas afetadas estavam de férias ou em cerimónias religiosas: 359 morreram, mais de 500 ficaram feridas. São sobreviventes mas para quem fica os dias que se seguem não são fáceis: há dificuldade em dormir, na cabeça nascem pensamentos intrusivos, memórias e recordações daqueles momentos, o corpo está hiperalerta, fica-se mais irritado, mais assustado, mais ansioso. “Se voltarem a estar em espaços com muita gente ou com muito barulho, podem vir a ter a mesma reação física”. É como premir um gatilho. Os sintomas podem verificar-se durante “algumas semanas, eventualmente um mês”. “Se durarem para lá disso, já temos de considerar a hipótese de haver stress pós-traumático e aí a abordagem terá de ser diferente.”

Ao mesmo tempo que os sobreviventes tentam esquecer ou interiorizar o que aconteceu, em que os familiares e amigos tentam fazer o luto de quem perderam, nas televisões, jornais, rádios o assunto não morre. Fala-se e continuar-se-á a falar do Sri Lanka tal como aconteceu depois dos ataques na Nova Zelândia, o que não ajuda a sobreviventes e familiares de vítimas. “É uma situação grotesca. São divulgadas imagens que a maioria das pessoas não tem resiliência para lidar, sendo muito afetadas por isso. Tudo se torna mais forte e difícil de processar, interiorizar ou esquecer. Tudo se torna mais presente”, diz Bruno Brito. (...)"

Fonte: Expresso